Sem título
- Clara Godoy
- 27 de fev. de 2022
- 3 min de leitura
Eu parei quando ele me disse que eu estava carente. De repente, não senti mais vontade de falar nada. Acho que ele estava tão certo que me calei. Percebi naquele momento, que precisava de carinho e não ia ganhar de nenhum lugar. Afinal, aquele não era o local apropriado para aquele carinho.
Eu lhe disse que estava triste. Ele sabe. Mas ele me deixou aqui, sozinha. Chorei deitada de lado. Depois fui até a sacada. Chorei sentada na mureta. Depois cortei minhas unhas, e tomei meu remédio. Agora deitada no sofá, já derrubei a primeira lágrima.
Acho que tendo esperança demais. Depois que ele jogar, que vai vir de fininho e tentar me acalmar. Que vai ouvir meu choro e falar palavras bonitas. Mas aconteceu duas vezes e eu não ouvi sua voz.
Talvez eu seja ingênua e imatura demais. Afinal, ele não quer ficar com uma pessoa triste como eu estou agora. Fico imaginando, melancólica, se um dia fizesse amor com ele, que ele me abandonaria. Que seu objetivo seria o prazer que eu poderia lhe proporcionar.
Eu queria que naquele dia, ele tivesse segurado minha mão. Que ele fingisse ver uma mancha em meu rosto, para tocar a minha bochecha. Que ele segurasse minha cintura e perguntasse gentilmente, se eu estava bem.
Estou sonhando novamente. Ele não sabe dos meus devaneios, duvido que ele se interesse, mas gostaria que meus anseios fossem verdade. Gostaria que ele soubesse que estou carente. Que sou patética, quero amor e ele não sabe, que quero conforto e ele não sabe que quero ouvir sua voz calma e poder chorar mas ele não me ouve.
Derrubei a segunda e a terceira lágrima. Desse sofá, no escuro da noite, na sala escura, só consigo ver as silhuetas assombrosas. A tv, os vasos, a persiana. A sacada aberta a qual me sentei e esperei uma mensagem, em vão. O prédio da frente, com pontinhos de luz acesos, pessoas felizes, que não me conhecem e não fariam nada para me ajudar.
Nos meus sonhos ele se levanta. Ele sabe que estou mal. Ele vem até mim. Ele descobre onde estou, descobre como cheguei, vem me acalmar, me abraça, me beija, me consola. São sonhos alucinógenos. Isso nunca aconteceria. Por que ele não gastaria seu tempo comigo. A patética sombra de menina, carente e não feliz, exatamente do jeito que ele não quer acalmar, abraçar, beijar ou consolar. Talvez ele nem queira mais beijar. Talvez ele nem queira mais consolar. Talvez eu tenha errado. Acho que errei.
Vou sempre ficar sozinha. As pessoas vêm e vão, e a certeza que fica é que vou ficar sozinha. Nenhum bonito da faculdade procura uma menina de olhos assustados e cabelo curto. Que não gosta de festas e que mais vale um videogame que uma saída. A menina, que não tem amigas para sair, por que as mesmas saem sem ela, sem se importar se ela está alegre ou infeliz, por que a menina não é mais problema delas.
A menina continua sozinha sabendo, como única certeza duas coisas. Uma é a que vai morrer. Não sabe quando, não sabe onde, não sabe como. A outra é de que, não importa o que aconteça, ela vai ficar sozinha.
Sem óculos é difícil enxergar os prédios a frente. Sei que o interfone não vai tocar, e que se eu voltar para a sacada para chorar, não vai aparecer ninguém me ligando, ninguém preocupado, ninguém. Por que as pessoas tem coisas a fazer. Tem vidas. Tem momentos, tem folgas, tem trabalhos tem lazeres.
A menina sempre soube que ia ficar sozinha. Só dói demais admitir
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